Em 1996, o Salão do Automóvel de São Paulo trazia muitas atrações. Entre elas estavam, carros do BTCC, o super festejado campeonato de turismo inglês, bólidos de F1 e Indy (em sua época de ouro), além de lançamentos como o Marea, e a presença tradicional das marcas de maior prestígio junto ao público, como Mercedes, Porsche e Ferrari.
Entretanto, o stand mais lotado, era o de uma humilde Parati. Tratava-se da EDP200, sigla para Engineering Design Prototype. Era um protótipo da VW construído com intuito de demonstrar a capacidade e o talento do seu setor de engenharia e design.
Segundo dados da revista Auto e Técnica, a VW gastou cerca de US$ 800.000,00 (isso mesmo, oitocentos mil dólares!) para criar essa Parati. Segundo eles, o custo foi assim elevado, em função de ter sido um projeto elaborado em parceria com os fornecedores, e que inclusive, poderia ter sido colocado em produção, se a VW quisesse. Chegou a se falar em produção artesanal de 10 carros por mês, ao preço módico de US$ 80.000,00. Mas como já se imaginava na época, a idéia não foi colocada em prática.
Cifras astronômicas à parte, a EDP 200 mostrou-se um concept muito importante e avançado para os padrões da época no Brasil. Seu desenho agressivo, inspirado nas competições de turismo e a reengenharia de quase todos os componentes do carro, de forma a criar um protótipo operacional, causaram uma ótima impressão à todos os que visitaram a feira naquele ano e marcaram a história do tuning no Brasil.
É importante lembrar que em 1996 a palavra "tuning" não era difundida no Brasil como é hoje. O próprio mercado internacional tinha ainda uma visão não muito bem definida do que a expressão "tuning" viria a simbolizar. Naquele momento, o tuning ainda representava para alguns um conceito em que se uniam a forma e a função.
E conceitualmente era disso que tratava a Parati EDP: Um concept que trazia a idéia de unir forma e função, através de um modelo especial, criado pelos engenheiros da VW e montado com peças "aftermarket", de uma forma que pudesse ser colocado no mercado.
Em um certo sentido parecia muito com os carros que os aficionados sonhavam um dia conseguir ter em sua garagem. Mas não aquele sonho inatingível. Era algo mais plausível, mais real, pois dava a impressão que de fato poderia ser realizado. Afinal, não era uma Ferrari ou Lamborghini, era uma simples Parati.
E para transformar o simples e comum em algo desejável, foram instalados volante Momo Champion, bancos Recaro Style, manopla de câmbio e pedaleiras especiais, rodas BBS, revestimento do interior em couro, sistema de som Clarion composto por dois módulos, de 500W cada, dois subwoofers, dois woofers, oito midrangers e quatro tweeters, CD changer de 18 discos e todas aquelas coisas que muitos de nós pelo menos uma vez na vida já sonhamos em fazer em nossos carros para torná-los um pouco mais especiais.
A parte mecânica trazia também motor e caixa do GTi 2.0 16v, porém com um veneno leve: Retrabalho de cabeçote, escape mais livre e comandos Crane, o que segundo a VW levava o motor ao patamar dos 200 cv, que faziam jus ao nome ao carro.
Combinar vários elementos para que o todo seja harmonioso visual e funcionalmente já é um trabalho que merece respeito, mas talvez o que mais chamasse a atenção nesse concept fosse o trabalho de carroceria realizado pelo pessoal da Volks.
As novas peças, foram modeladas em clay, um tipo de massa específico para isso e posteriormente moldados em fibra, segundo a VW, de carbono. O grupo óptico superior foi substituído por dois pares de faróis redondos e simétricos, incrustados em uma espécie de máscara, que tomava o lugar da grade, e também abrigava os piscas ou setas de direção. Como a grade superior era totalmente fechada, toda a refrigeração era feita através da tomada frontal do pára-choques. Esta, não era constituída de travessas horizontais, como nos modelos de linha, mas sim de uma única chapa furada estampada e moldada. A grande “boca” abrigava também um par de faróis de milha.
O pára-choques dianteiro, rente à carroceria, trazia incorporados spoilers defletores de ar e tomadas de ar estilo “tubarão” para os freios dianteiros. Além disso, estava bem integrado com os alargadores de pára-lamas, que foram aparafusados na carroceria com o intuito de manter as rodas maiores totalmente dentro deles.
Nas laterais, foram instalados apliques, que alargavam o carro visualmente, e spoilers inferiores, que continuavam as linhas criadas pelo defletor frontal. Próximo as caixas de rodas traseiras, haviam tomadas de ar para os freios, semelhantes as dianteiras.
Na traseira, a mesma coisa: pára-choques rentes ao carro, spoilers inferiores muito baixos, defletor de teto sobre o vidro traseiro, para “alongar” o carro, melhorando assim o coeficiente de penetração aerodinâmica, e uma grade de chapa estampada, semelhante a dianteira, em cuja base havia um acabamento imitando os extratores de ar dos carros de corrida.
Externamente, outros detalhes como retrovisores em concha pequenos, com hastes de alumínio, lanternas fumê que eram vanguarda na época, ponteira de escape quadrada em inox, pinças de freio vermelhas, tampa de combustível em alumínio, antena de teto tipo GTI e faróis escuros completavam o visual da EDP.
Apesar da irrepreensível qualidade da fabricação do carro e das peças especiais, alguns desses elementos eram exagerados, talvez chamativos demais para um carro que pudesse ser de fato comercializado. Mas todos eles, se não eram funcionais, ao menos compartilhavam os fundamentos da funcionalidade com os carros de competição que foram inspiração para as modificações.
Se olharmos a EDP hoje, como um carro que poderia estar em nossa garagem, talvez a percebamos como algo interessante em termos de engenharia, mas que passou um pouco do ponto em termos de design, principalmente após a grande onda do tuning. Mas talvez isso seja mais um mérito do que um defeito, pois os concepts são criados justamente para traduzir e comunicar as tendências dos mercados, muits vezes justamente através dos exageros visuais.
Mustang MACH III concept trouxe diversos elementos que deram origem à quarta geração do Mustang em 1994
O tsunami do tuning com certeza causou uma grande reviravolta no mercado, associando a imagem das modificações em automóveis com o preconceito de uma grande parte dos consumidores desse meio. Será que a idéia da VW de apresentar um conceito que estava ligado nas tendências do mercado foi levada e desapareceu com essa onda?
Há alguns dias fiz uma busca pela Parati EDP200 na net e só encontrei uma foto muito pequena, sem definição e sem nenhuma explicação do que era ou por quê havia sido criada. De uma certa forma isso me entristeceu, pois quem morre com isso é a nossa cultura de carros.
Talvez o que nos falte por aqui, em termos culturais, seja "tempo de serviço". Quem sabe, comparados com outros países mais desenvolvidos automobilisticamente, tenhamos ainda pouca história. E é precisamente por isso que não devemos esquecer as iniciativas que marcaram época. Então, achei importante trazer de volta um pouco dessas fotos e dessa história, para que não fiquem no esquecimento.
Eu ainda guardo a imagem daquela Parati totalmente diferente, de acabamento impecável em seu estande giratório, permanentemente apinhado de pessoas, que ofuscou até mesmo as maiores estrelas do Salão de 96. Pouco importa se era realmente prêt à porter ou simplesmente moda conceitual. O que importa é que estava lá, chamando a atenção para uma crescente tendência cultural, o aftermarket, que nada mais é o mercado de peças de modificação e performance, do qual todos fazemos parte.
Sensacional!
ResponderExcluirEra realmente bacana.
ResponderExcluirMostrou de uma forma clara que era possivel fazer coisas com qualidade no after market, que a fabrica teria muitos problemas em fazer de forma operacional.
Esta foi a maior lição que deixou.
Cara, parabens pela postagem....eu me recordo de ter visto ela ao vivo em 96 e fiquei doido, realmente é uma pena ela ser "esquecida", ela possuia um desenho que nao faria feio na serie Velozes e Furiosos.
ResponderExcluirA revista MOTOR SHOW tb fez uma matéria com ela nomeada " PARATI DE DAR AGUA NA BOCA".
Abraços,
Roger
Eu tenho a revista Auto&Técnica com a matéria dessa Parati EDP 200. Sem dúvida foi um marco na equipe de engenharia e design da VW do Brasil. Bem que eles poderiam ter lançado algo parecido naquele tempo e fazer uma versão ainda mais exclusiva que a Parati GTi, mas não fizeram... e hoje essa é uma idéia impossível quando nos deparamos que o que existe no mercado brasileiro hoje é uma mistura de carro exclusivos para países de terceiro mundo (Índia, China, Turquia etc) com outros projetos europeus de 15 anos atrás.
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